terça-feira, 11 de março de 2008

"Quer uma pauta exclusiva?"

(ou, "Como ganhar espaço na imprensa")

Esta é uma história que acontece todo dia. E o leitor não fica sabendo...
Uma empresa contrata uma assessoria de imprensa para facilitar seu relacionamento com os jornalistas, treinar seus executivos a responder abertamente algumas questões e ser incrivelmente vagos em perguntas importantes. Além disso, as empresas pressionam os assessores de imprensa a cavar espaço nos jornais, revistas e blogs com a proposta de "pauta exclusiva".
Funciona assim: a empresa tem um novo produto ou está interessado em divulgá-lo em um jornal, com o maior espaço possível, e --melhor ainda-- com a roupagem da "abordagem jornalística". Dá mais credibilidade e sai bem mais barato que comprar espaço publicitário no mesmo veículo --o que fomenta a saúde financeira da imprensa e da democracia!
Até aí, tudo bem, o jogo é esse, e os ingênuos dançam. Eu, jornalista, tenho que pensar no meu leitor, e não fazer o jogo das relações públicas. Isso não significa que vou ser refratário ou ter repulsa às propostas das assessorias. Aceito boas idéias, na boa.
Mas não gosto das propostas de "pautas exclusivas" porque as assessorias seguram a divulgação de um material que deveria ir ao mesmo tempo para toda a imprensa e elas o passam a um jornalista prometendo exclusividade até que ele o publique. Não gosto de ficar na obrigação de publicar algo, pressionado pela assessoria que quer ver logo o resultado publicado. De preferência, que eu publique rápido, com grande espaço e tom favorável. Em geral, eu recuso.
Tudo isso pra dizer que hoje fiquei surpreso com uma assessora, de uma gigante da tecnologia, a HP (sem rodeios). Ontem, ela propôs uma "exclusiva". Pedi mais informações, pra checar a relevância. A resposta veio. É a união entre a HP e uma parceira (não revelo o nome, seria sacanagem) que ainda é uma oferta ao mercado. Ou seja, ainda não tem clientes e pro meu leitor não serve, infelizmente. Se publicasse, sem análise e crítica, faria propaganda gratuita para as duas empresas.
Depois de esgrimirmos argumentos, concordei, marcamos horário, o entrevistado inclusive é meu colega da Politécnica. O papo ia ser bacana. Então, antes de ela desligar, eu disse "espera, e a entrevista que eu pedi há semanas com o presidente da empresa?". "Ah, isso está para ser decidido na reunião de amanhã, nós não temos poder sobre a agenda do presidente, que tem suas prioridades, inclusive atender jornalistas". Senti que entrevistar o presidente seria mais uma luta no limbo burocrático de decisões de uma corporação e reclamei:
-- Vou fazer papel de bobo se eu não conseguir a entrevista que eu pedi e fizer a entrevista a partir da oferta da assessoria, que pode virar uma publicidade gratuita. Ou seja, a minha demanda não é atendida e eu atendo a de vocês? -- E lembrei a ela que, quando a então CEO Carly Fiorina veio ao Brasil, a assessoria fez uma barbeiragem e me excluiu de um encontro da executiva com alguns jornalistas selecionados a dedo. Detalhe: eu pedia a entrevista há meses à empresa.
A resposta dela:
-- Então vamos fazer assim. Esquece a proposta que eu fiz, nós vamos oferecer a pauta a outro
veículo. E teu pedido de entrevista com o presidente continua lá, vamos ver na reunião.
Ahnn? Então tá.
Resumo da ópera. Se o jornalista não faz o que a assessoria deseja, e se é incisivo em seus pedidos incômodos, que ele se vire. A assessoria oferece o material exclusivo a teu concorrente. Divulgas a todos igualmente, nem pensar...
Como eu já estou há um bom tempo no mercado, e não procuro "furos de reportagem", mas sim fazer textos relevantes e inteligentes, não me importo.
Vou me importar se a empresa e assessoria enrolarem para atenderem meu pedido de entrevista... ;-)

4 comentários:

Flávio Sartori disse...

Legal Max, você voltar a escrever no seu blog.
Abraços
Flavio

Objeto Reanimado disse...

Max, não quero discordar de vc, mas não posso aceitar esse post sem responder. Não apenas por ser uma das pessoas da equipe de atendimento da HP na Burson, mas pq já estou nesse mercado há mais de 20 anos e você é testemunha disso. A oferta de pautas exclusivas é, antes de mais nada, uma demanda dos próprios jornalistas que muitas vezes colocam a exclusividade como condição para dar matérias com algum destaque. O ideal para nós assessores é conseguir reunir quantidade com qualidade, mas isso nem sempre é possível.
Não quero aqui questionar o caso específico da entrevista que oferecemos a você, pois a decisão sobre a relevância da pauta para os seus leitores é sua e não questionamos isso. No entanto, não existe nenhuma relação entre uma pauta de um dos business da HP e uma entrevista com o presidente, que, como já foi dito, está sendo negociada e será realizada assim que for possível. O interesse também é nosso e da empresa.
Espero que o fato de aguardamos essa disponibilidade de agenda não limite os espaços da HP no Informática hoje.
Um abraço, Denise Marcolino

johnny bright disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
johnny bright disse...

Oi, Max, interessante esse post, acho que existe uma moeda de troca que não deveria existir, que é a tal "exclusividade". Apóio a tua atitude de não participar, mas é mais ou menos como reclamar de terremoto, ele acontece não importa o quanto a gente reclame. :o)
O único forma de mudar isso é essa mesma, não entrar no jogo. Se todos os coleguinhas fizerem isso, o jogo termina. Acho difícil. A competição entre os próprios jornalistas para conseguir uma "exclusividade" passageira e insignificante, que só tem valor dentro do mundinho das redações, é muito grande.
Ah, aí vai o link do meu site nerd.
Abs,
JB